“A poesia não se entrega a quem a define.


Mário Quintana


terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Devaneios


Correspondências...

[Na portaria]
-Tem carta pra mim Geraldo?
-Tem não moça, ainda esperando notícias?
-Pois é Geraldo, ainda esperando, acho que vou esperar a vida inteira não acha?
-Logo chega alguma coisa... Assim que chegar eu ligo pra vir buscar, ou mando alguém entregar...

Depois de receber um comprimido de esperança de um segurança de condomínio, os passos lentos até o apartamento parecem ser uma peregrinação até a Nova Jerusalém (ou até Aparecida pra ser menos dramática...) O sol é forte e as frustrações pedem um banho e um copo de Coca-Cola gelada!
Me olho no espelho com olhos de quem não cabe no mesmo folhetim, e nem numa atualização de qualquer rede social... Frustrante.

Os peixes no aquário recebem sua porção de alimento e eu os observo, será que é assim com os sentimentos? A gente vai alimentando e eles vão permanecendo, crescendo, se multiplicando, até transbordarem no aquário do coração?
Será que funciona no inverso? Se pararmos de alimentar, como o peixe que morreu no mês passado, eu posso jogar ele pela descarga e ainda dizer pro meu priminho que uma fadinha se apaixonou por ele e veio buscar pra viver com ela como numa boba, mas reconfortante história infantil? Posso esconder um sentimento ilusório em uma outra ilusão? Seria saudável ou menos perigoso pro coração? Como aquela pele de frango que a gente coloca do lado do prato pra diminuir a culpa?
O telefone toca, uma, duas, três insistentes vezes:
-Moça? Sua carta chegou, quer que entregue? (O coração pula no peito feito o peixe suicida aquário...)
- Entrega pra mim Geraldo.
-Ok.
Alguns minutos depois a porta se fecha com um silencioso agradecimento e um par de mãos geladas segurando um envelope de papel.
Os olhos fixos num endereço qualquer, o nome sempre bonito de se pronunciar... Coloco a carta sob a luz do abajur e vejo a letra sempre tão incompreensível meio jogada de lado como quem tem pressa, cheiro o cheiro do tabaco forte e sempre amadeirado, as pontas do envelope sujas de qualquer coisa amarelada que não de dou ao trabalho de tentar descobrir, jogo-a longe e logo a recupero como quem descobre um tesouro ou um objeto favorito, escondo-a só pra ter o prazer de achá-la minutos depois, como criança travessa brincando de esconde-esconde.
A carta está em cima da escrivaninha faz 3 meses, intacta... Às vezes olho pra ela, seguro entre os dedos e repito a mesma brincadeira de esconder pra depois encontrar como se fosse surpresa, pra fingir uma saudade que eu não enterrei e só contei pro meu coração que uma fada levou pra morar com ela, assim como fiz com meu priminho, funcionou com ele, talvez funcione comigo... Nenhum peixe do aquário morreu esse mês.
Prefiro manter meu “peixe” alimentado assim, de migalhas, pra não morrer estufado nem de fome... Pelo menos por enquanto... Até trocar a água do aquário... 

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